Felicia finalmente descobre quem interceptou seu roubo, e agora se vê diante de uma oferta tentadora e algo muito importante em troca! Para isso, ela vai precisar invadir um dos locais mais seguros do mundo!
Gata Negra Fugitiva #01 – Contrato de risco
Por Pedro Caldeira
Chicago, 11:00am
A conversa com o coronel Fury não saía da cabeça de Felicia. Até mesmo durante o voo vindo de Nova York, aquelas revelações bombásticas atacavam seus pensamentos. Ela também não entendia o motivo de ter sido a escolhida para ajudá-lo, visto que, no mundo inteiro, existem, com certeza, espiões muito mais gabaritados para realizar a missão.
“Eu sou uma ladra!” – pensava, ainda na poltrona da primeira classe do avião, enquanto analisava a papelada contida no envelope pardo entregue pelo maior nome da S.H.I.E.L.D..
Nas horas da viagem ela também estudou o processo de como seria feito o contato com Potenza, seu informante, que daria todos os passos para que Felicia pudesse invadir o quartel da ANS e roubar informações ultra-secretas.
Não levou bagagens para parecer mais discreta, apenas uma bolsa de mão, onde havia seu cartão de crédito internacional – sem limite – documentos, seu telefone celular e, obviamente, produtos de beleza. O material entregue por Fury fora queimado.
Quando desembarcou em Chicago, logo pegou um táxi e se dirigiu para o ponto final da Linha Castanha do metrô: a estação Kimball.
Seu nervosismo estava sendo controlado apesar de ser a sua segunda grande missão; mas a primeira com grandes chances de ser detida. Ela sabia que se isso acontecesse, Fury não poderia interferir em nada. Era um contrato de risco.
Sentada, esperando o transporte de meio-dia, ela observava as pessoas correndo contra um tempo criado por elas mesmas. Imaginava o que cada um estaria fazendo ou teria que fazer. E até ria, quando lembrava que o mundo estava na beira de um caos e que ninguém tinha a menor ideia disso. Sentiu-se orgulhosa, até, por ter sido confiada a um segredo.
“Que ironia. Como acreditar num ladrão?”
Felicia sabia que se ela traísse Fury, seu mundinho teria os dias contatos e que, muito provavelmente, seus entes queridos também pagariam pelo ato irresponsável.
“Ainda faltam 15 minutos pro trem partir…”
Olhava um grupo de negros moradores de rua que faziam um som usando instrumentos musicais velhos, quebrados e, até mesmo, improvisados. Dessa vez não seriam as músicas eletrônicas, com mais de 200 batidas por minuto, ou a canção descompassada, que embalavam sua vida de gatuna. A música a remetia às lembranças do que sua mãe, Lydia Hardy, costumeiramente, fazia à noite: ouvir um LP com canções dos anos 60, 70, às vezes 90, acompanhado por algumas doses de conhaque aquecidas ali, na lareira mesmo. Todo dia igual, à espera do marido, ou como em anos depois, à espera da filha.
E matando a saudade da época em que o cheiro da bebida a inebriava quando menina, Felicia pensava: Tá. Parece Norah Jones. Ritmo antigo com uma nova roupagem. Nem deve ser comparado ao clássico que mamãe ouvia, mas...
O vento frio lhe tocava o pescoço e uma parte do busto.
“Jazz dá uma vontade danada de se apaixonar!”
Subitamente, foi despertada pelo aviso sonoro de que o metrô estava chegando. No início, ela até estranhou que os vagões estavam vazios, e que até na estação não havia muitos passageiros.
Embarcou e logo tratou de se recordar da forma de contactar Potenza. Caminhou lentamente, sem se preocupar com o equilíbrio, até ver, meio no canto, uma bolsa pequena do Chicago Bulls, nas cores tradicionais. Sorriu e se aproximou do homem que a portava.
- Parece que as ações da America Airlines caíram. – disse, segundo o protocolo passado por Fury.
- Por isso prefiro viajar de trem. – a resposta bateu com as informações contidas no envelope.
Felicia não resistiu e fitou o homem, dos pés à cabeça, e não acreditou no que via. Fugia totalmente das suas expectativas, do que tinha imaginado. Era um homem com quase 60 anos, branco, barba por fazer, trajando calça de moletom cinza e casaco preto do Bulls, um boné meio rasgado e um hálito que revelava que ele acabara de tomar um trago de vodca.
Passada a preliminar de reconhecimento, os dois mantiveram um silêncio breve.
- Sei que deve estar me achando velho. Pois saiba que eu também te acho muito jovem. – disse Potenza, desdenhando.
- Falando assim fica parecendo que somos pretendentes a um relacionamento sério.
- Depois dessa resposta posso imaginar por que foi escolhida.
Felicia sorriu, vitoriosa.
- Temos 30 minutos até a chegada em Downtown. E é lá, na estação Clark/Lake, que vou descer. Então, aproveite essas 18 paradas a outras estações para me entender e colher o material na bolsa.
- Não posso ficar com ela? Sempre gostei de Michael Jordan.
- Você nem tem idade para ter acompanhado os jogos dele.
- Ouviu falar numa coisa chamada internet?
- Sabia que não é de bom tom subestimar as pessoas?
Ele havia pegado Felicia de jeito. Como foi tonta ela! Como ousou duvidar de um homem indicado pelo próprio Nick Fury? Então, lhe restou os pedidos de desculpas…
O silêncio reinou novamente ate que eles cruzaram o rio Chicago, entre as estações Francisco e Rockwell.
- A primeira coisa que você tem que fazer é se passar por outra pessoa. Isso porque você precisa seduzir um funcionário da ANS. Consegue fazer isso?
- Eu sinto que você se sente incomodado com minha presença! – e pisca o olho, tanto que Potenza se ajeita na cadeira.
- Ele é um jovem brilhante mas, como todo jovem brilhante, é ingênuo. E para complicar mais – no bom sentido – ele é um nerd viciado em cultura pop.
- Seria bem estranho uma mulher linda como eu dar em cima de um nerd…
- Como vai fazer isso não é problema meu – responde, revelando o quão ranzinza é – Mas para sua sorte, seu alvo é viciado em sinuca. Ele vai, religiosamente, toda sexta, às oito horas da noite, à mesma casa de jogos, fica na mesma mesa, enfim, tem todo um ritual.
- Isso me parece coisa de gente que tem TOC.
Potenza não resiste e sorri. Realmente é difícil não se divertir com Felicia.
- Como hoje é quinta, você deve partir para Maryland esta noite e se hospedar em algum lugar discreto para não levantar suspeitas. E, mais ainda para sua sorte, seu alvo não vai trabalhar no sábado. Digo mais: para provar o quanto você é sortuda, ele vai folgar no sábado.
- Isso significa que devo invadir no sábado?
- Que garota inteligente!
- E bonita, não esqueça.
- Bom, sábado é o dia oficial de visitas de estudantes de universidades americanas, geralmente alunos de direito, que chegam em grandes grupos.
- Hum, estou tendo algumas idéias! Mas… e lá dentro?
- Nessa sacola – que você tanto quer! – tem alguns utensílios que podem auxiliar na missão: são mapas, plantas baixas, sistemas e esquemas de segurança, um IPhone que na verdade é um scanner de digitais e gravador e reprodutor de voz, leitores ópticos para que sejam copiadas as íris e retinas, e o meu preferido: a máquina de cartão, para que você possa imprimir dados e fotos num provável cartão de acesso, para que passe despercebida.
- Posso me tornar uma aluna de direito de Harvard assim?
- Claro, mas não esqueça de que a impressão fica apenas na parte de fora do cartão. O fundo, com os códigos de barra e demais processos de segurança, precisa ser o original.
Potenza abre a bolsa, retira um crachá e entrega para Felicia.
- Parece que li seus pensamentos, gatinha!
Felicia se surpreende ao ver que é uma estudante de direito de Harvard!
- Fale sério!
- Chamemos isso de uma feliz coincidência.
Faltavam apenas sete estações para o destino final.
- Como eu mexo nessa tecnologia toda?
- Há um manual, não se preocupe. Sei que seu negócio é roubar diamantes e soltar detentos de presídios federais…
Surpresa, Felicia questiona:
- Como sabe tanto assim de mim?
- Esqueceu quem sou?
- Verdade… Posso então pedir um favor?
- Só se puder me pagar com outro.
- Preciso de algo mais afiado do que cortadores de vidro para usar como garras. Conhece algum material?
- Posso me informar.
- Se me conseguir algo nesse nível, te dou algo em troca. E não pense besteiras, ok?
- Meu preço está escrito aí, na última folha do manual.
- Você tá me deixando assustada!
- Bom trabalho, Felicia. Agora preciso ir.
- Espera! Nosso encontro termina em Downtown…
- Você é uma garota esperta. Vai se dar bem. Eu entro em contato.
Assim que o metrô parou na estação Diversey, Felicia viu um grande homem – misterioso, verdade – sair sem deixar vestígios. Como todos os felinos, a curiosidade fez com que ela puxasse a bolsa, a abrisse e, discretamente, admirasse todo aquele equipamento, além de outras surpresas…
Maryland
Mais algumas horas dentro de um avião, na primeira classe. Fury parecia ter sumido como mágica dos seus pensamentos. Agora só Potenza a intrigava. E todas aquelas palavras de “sorte” que iam de encontro ao que Felicia acreditava: ela era a encarnação do azar.
Depois de aproximadamente 10 milhas saindo do Baltimore Washington International Airport, Felicia chegou a Jessup e logo tratou de se hospedar no La Quinta Inn and Suites Columbia, lugar agradável e distante 03 milhas do Fort George G. Meade, ou seja, da Agência Nacional de Segurança.
Deitada na cama, ela decidiu não pensar em nada, nem em ninguém. Queria repousar para, no dia seguinte, encarar a fatídica sexta-feira de sinuca.
Depois de um banho quente, saiu enrolada, molhando o piso do confortável quarto, que tinha a diária ao custo de 450 dólares. Bem discreto…
E assim adormeceu. Sem se preocupar absolutamente com nada.
Pela manhã, foi até a recepção se informar sobre aluguéis de veículos, mapas para a região e locais ideais para compras. Pronto. Agora era a hora da festa.
Saindo ao norte para a School Street, Felicia quase se perdeu na rotatória, mas depois de aproximadamente 35 minutos ela chegou a Annapolis Boulevard, onde, finalmente, pode fazer compras, especialmente, as roupas sérias de uma estudante de direito. Inclusive, passou pelo Big Daddy’s Billiards LLC, local onde seu alvo se divertia, solitariamente, nas noites de sexta.
Entrou para conhecer o terreno e pescou comentários de frequentadores, que justificavam a preferência pelo estabelecimento. Sem mais o que fazer, retornou para o hotel, com a intenção de mais uma sessão de preparo e estudo. Só lhe restava esperar.
Sete da noite e Felicia já estava novamente ao Big Daddy’s. Trajando uma saia e um blazer cinza e blusa branca, ela logo tratou de pegar a mesa que o alvo escolhia sempre, mesmo recebendo aviso de um funcionário de que havia uma reserva.
Ela não sabia nada de sinuca, então, entrou em ação seu lado preferido. Se aproximou de um homem bem apessoado, que parecia jogar bem.
- Quer ganhar 100 pratas?
Curioso e animado, o homem se virou.
- Por você faço de graça. Do que precisa? Aulas?
- Na verdade quero que finja que me conhece e que me deixe ganhar uma partida.
- Só isso? Relaxa, gata. Me pague uma bebida que fica tudo resolvido.
- Mas vamos ficar nessa até umas oito e quinze, pode ser?
- Se eu me apaixonar vou querer você pra sempre…
Felicia sorriu e logo tratou de tomar um curso intensivo com seu novo amigo.
O tempo passou e seu alvo entrou. Viu que a mesa estava ocupada e foi reclamar com a gerência do estabelecimento. Um funcionário se aproximou para conversar com Felicia, que logo o interrompeu:
- Quem é? Peça para que ele venha falar comigo.
Em poucos minutos o alvo se aproximou.
- Boa noite, é que você está na minha mesa…
- Desculpa, mas não vi seu nome escrito aqui.
- Bom, é que toda sexta eu venho aqui e sempre fico nesta mesa.
- Não podemos resolver isso de outra forma?
- Joguem uma partida! Quem ganhar, decide! – disse o novo amigo de Felicia.
- Topa? – perguntou a ladra.
- Fechado. – respondeu, confiante, o alvo.
Rapidamente Felicia foi derrotada, e pôs-se a rir.
- Desculpa por incomodar… como é mesmo seu nome?
- Pode me chamar de Travis.
Felicia finalmente o mirou e viu que ele não era um daqueles nerds estereotipados. Tinha um corpo trabalhado, cabelos espetados, barba por fazer, algo bem sexy e contraditório. Seria ele mesmo o alvo? Se não fossem pelo nome e pelas características, como roupas de trabalho, Felicia duvidaria.
- Você é nova na cidade, né?
- Eu vim de Nova York para o aniversário de minha tinha que mora em Jessup. Daí eu estava entediada e ela sugeriu que eu viesse me divertir aqui.
- Entendo. Seu namorado – aponta para o “professor” – não vai se importar da gente ficar conversando?
- Namorado? Que nada! Conheci ele aqui. Ele queria minha mesa, o desafiei e ganhei.
Risos.
- Então, Travis, é melhor eu ir embora.
- Não. Fica. Nem sei seu nome.
- Felicia…
- Vamos jogar. Eu pago uma rodada de bebida pra você.
- Você não bebe?
- Não…
“Droga!!!!”
- Tá certo. Mas tente não me humilhar muito!
Então os dois passaram a jogar. Ele ensinava Felicia dicas sobre o taco e sobre como bater nas bolas para obter melhores resultados, além de falar das regras. Felicia fingia estar bebendo. O tempo dessa noite divertida passou e finalmente era a hora da despedida.
- Vou ter que dirigir até lá, Travis. Não tou acostumada ainda.
- Não quer fazer outra coisa?
- Tá me chamando pra ir na sua casa?
Pego no susto, Travis riu e balançou a cabeça, positivamente.
- E sua namorada?
- Ela terminou comigo.
- Que ótimo! Digo, que chato. Mas acho melhor não. Acabei de te conhecer. Ainda por cima, numa casa de jogos. Dizem que traz má sorte.
- Que pena. Me dá seu número então?
- Me dá o seu que eu ligo! – respondeu, maliciosamente, a ladra.
Os dois saíram juntos, cada um pra seu carro.
- Droga! Acho que perdi minha chave! – falou Felicia.
- Podemos chamar o guincho, ou a locadora, ou até mesmo, providenciar um…
- Me dá uma carona? – disse, enquanto fingia estar caindo, bêbada, para se apoiar nele.
No carro, pegando a rodovia com destino a Jessup, Felicia previa que seu plano estava dando errado. Então, decidiu improvisar: beijou Travis fervorosamente à boca, tanto que ele quase bateu o carro.
- Me leva pra sua casa.
O retorno foi feito desesperadamente…
Odenton
A casa de Travis estava vazia; seus pais estavam viajando e só retornariam no domingo à noite.
- Confessa, Travis, você sempre faz isso com suas paqueras, né?
- Não!! Acredite em mim!
Enquanto andavam por dentro da casa, Felicia analisava a decoração, e assim fazia um diagnóstico da renda da família. Mas o susto veio quando ela chegou ao quarto dele: nas paredes, fotos de herois, nas prateleiras, inúmeras figuras de ação, muitos gibis, produtos de tecnologia, enfim.
- Uau! Você é um cara bem desenvolvido!
Mais risos.
Travis se sentou na cama, puxando Felicia pela cintura.
- Você é linda. – e a beijou.
Felicia parecia mesmo estar interessada no alvo, até o momento em que ele a largou e se retirou, afirmando que ia pegar água.
Sozinha, sacudiu a cabeça e despertou.
- Dessa vez não preciso de sorte, preciso de cautela!
Abriu a bolsa e preparou a armadilha: um potente sonífero, presente de Potenza. Passou-o sobre os lábios e nem ousou fechar a boca ou alisá-los com a língua. Assim que Travis entrou com uma garrafa, Felicia saltou sobre ele, deu uma espécie de golpe de judô, o derrubando na cama, sentou sobre ele e o beijou, garantindo que todo o produto estava sendo passado.
Em seguida tirou o blazer e amarrou as mãos do alvo com ele, e o prendeu na cama.
- Você é… sensacional!
- Na verdade… eu sou uma ladra! – um soco, que o fez dormir de vez.
Pegou fitas adesivas, cordas e tudo que pudesse servir para deixá-lo incapaz durante, pelo menos, todo o dia de sábado.
Confirmando que ele não era mais uma ameaça, vasculhou os objetos pessoais, espalhando tudo pelo chão. Gavetas. Pastas. Até achar seu cartão da ANS. Pegou os utensílios dados por Potenza e logo tratou de digitalizar suas impressões digitais, copiar dados da retina e das íris, além de confirmar que tinha gravado diversas frases, em diversos tons, suficientes para que pudesse formar uma possível palavra secreta que daria acesso a um novo nível de segurança na ANS. Por fim, não resistiu e lambeu o rosto dele e mordeu-lhe o queixo, frustrada, ao vê-lo só de cueca, por não poder aproveitar mais a noite…
Continua em S.H.I.E.L.D: A MÃO ESQUERDA – Parte 2
+ comentários + 4 comentários
Sensacional esse capítulo cara!
Você realmente nasceu para escrever a Felícia cara!
Os detalhes, principalmente a conversa com o Potenza, ficaram espetaculares! Tudo muito bem traçado, até esse excelente final! Fiquei até com dó do Travis... Hehehe
Meus parabéns pela excelente história cara!
Um abração e até mais!!!
mwhaha! valeu, cara... escrever a gata negra é sempre divertido pra mim! valeu mesmo pela leitura e pelo comentário!! abs que agora vou ler Capitas, mwhaha!
sim, ela amadureceu precocemente. pudera, com a família que tem... e tem diversão, então, pode ser que saia algo interessante num futuro cross! valeu, morete!!
valeu mesmo, matrix. felicia é minha personagem preferida de tudo que já foi feito em hqs, por isso tenho tamanha preocupação ao escrever seus atos e tal. valeu pela leitura, cara!
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