Banda Delete. A banda n° 1 dos fãs coloridos, enfrenta os terríveis zumbis de Santa Fé. Poderão os jovens e sensíveis músicos escaparem dos dentes dos mortos-vivos?
(Ilustração da capa por Anderson "Brima-Aracnos" Oliveira)
OS ZUMBIS E OS COLORIDOS
Por Alex Nery
Nossa Senhora de Santa Fé
Noite de DomingoEstádio Municipal
Show da banda DeleteA multidão estava eufórica. Milhares de pessoas haviam deixado suas casas para assistir à única apresentação da famosa banda Delete no município. Adolescentes coloridos saltitavam mais do que gazelas no cio, enquanto no palco, os quatro músicos adolescentes, líderes do movimento colorido despejavam suas canções, todas no top 10 das rádios pop do país.
Na bateria, Zé Lucas, vinte e um anos, moreno e musculoso. Possuidor de um sorriso de galã de Malhação.
À direita do palco, na guitarra, Pru, o músico de dezesseis anos, xodó da ala fúcsia do fã clube.
À esquerda, Fucho, o colorido mais “fofinho” do grupo. Daí vinha seu apelido, derivado de “fofucho”, como diziam as fãs.
À frente, arrancando gritinhos de todo tipo de criatura saltitante presente, estava Pi Tomba, o vocalista e líder da banda.
Na platéia, as pessoas estavam alvoroçadas. Várias faixas de fã clubes podiam ser vistas:
“A FAMÍLIA MACHINE AMA VOCÊS!”
“QUERO CONHECER VOCÊS PESSOALMENTE. ASSINADO: CHÉDOU”
Um dos momentos altos do show foi quando o DJ da rádio local sorteou uma fã para subir ao palco e conhecer os ídolos.
- Vamos lá, pessoal! Aqui está o nome da sortuda, ou do sortudo... vejamos....
As fãs prenderam a respiração enquanto o DJ fazia suspense.
- É uma sortuda! O nome dela é... VAMPYYYYY!!!!
Depois de alguns instantes, a fã sortuda subiu ao palco. Ela chorava e pulava emocionada ao encontrar seus ídolos.
- Eu quero mandar um beijo pro meu namorado, Frê! – disse ela.
A banda atacou com o hit que estava estourado em todas as rádios: “Vem, Jorge”, que Pi Tomba, o vocalista e baixista da banda, havia composto em homenagem ao seu gato, um gato balinês que ele tinha desde os oito anos de idade, chamado “Jorge”, e que havia morrido atropelado pelo sorveteiro do bairro cinco anos depois.
Assim como Pi, várias fãs debulharam-se em lágrimas, emocionadas com a homenagem.
Nossa Senhora de Santa Fé
Tarde de Segunda-Feira
Saguão do Hotel “Rogério Cormão”, 13:29 h.Os quatro músicos aguardavam entediados pela van que os levaria ao aeroporto.
- O Silvio é um filhodaputa... – resmungou Pi.
- De marca maior... – concordou Zé Lucas.
- Quê isso, galera... Por que essa chateação? – perguntou Pru.
- Porra... – praguejou Fucho – Primeiro ele manda a gente pra esse fim de mundo, fazer show num estádio menor que o meu quarto... e depois deixa a gente mofando aqui.
- Ah, ele disse que tinha um encontro com o George Doriana, o dono da gravadora – explicou Pru.
- Tomara que ele saia de lá com mais dois CDs fechados... – rangeu Pi.
- Aqui não é tão ruim... Viram a loucura de ontem? Aqui somos deuses!
- Pru... já te disse... aquele segurança não tava olhando pra ti...
- Estraga-prazer...
Algumas pessoas entravam e saiam agitadas do hotel. De início isso não atraiu a atenção dos coloridos, mas logo eles perceberam uma agitação incomum em uma das entradas.
- Ih, lá vem essas doidas histéricas fazendo barraco... – disse Pru, olhando para a entrada do hotel, onde os dois seguranças tentavam impedir a entrada de um grupo de pessoas.
- Será que o Justino Biba passa por isso? – perguntou Fucho.
- Claro que não... ele tem um empresário melhor que arruma seguranças e hotéis melhores... – disse Pi.
Um dos seguranças caiu para trás. O grupo que tentava invadir o hotel avançou sobre ele.
- Cruzes! Olha aquilo!
- Parece que tão...
- Tão...
- Tão mordendo o cara?
O grupo de pessoas amontoava-se sobre o segurança, mordendo-o em seus braços, pernas e rosto. Pareciam cães famintos. Mordiam e sacudiam a cabeça procurando arrancar um pedaço de carne.
O outro segurança tentou tirar as pessoas de cima de seu colega, mas logo foi abocanhado no pescoço por um dos invasores.
Os quatro observavam atônitos a cena, enquanto as outras pessoas corriam apavoradas. Logo perceberam que uma dos atacantes possuía o corpo seco e semi-devorado.
- Putaquepariu...
- Que porra é essa, véio?
- É... É...
- Uma fã subnutrida?
A criatura rosnou, exibindo seus dentes amarelos e começou a se arrastar em direção aos músicos.
- Glup!
- Fã subnutrida é o caralho!
- É... É...
- ... UMA ZUMBI!
Os quatro abriam as portas do hotel e saíram correndo apavorados. Pi e Pru corriam na frente, sendo seguidos por Zé Lucas e Fucho. Eles correram cegamente, sem a menor noção de para onde estavam indo.
Somente quando pararam no meio da rua, olharam em volta. Dezenas de zumbis arrastavam-se pela área. Alguns dando cabeçadas nos postes, tropeçando nos próprios pés ou avançando a esmo.
- Mas que putaquepariu é essa? – gritou Pi.
Imediatamente os zumbis perceberam a presença do grupo.
- Ai, caralho... por que tu não fica calado? – resmungou Zé Lucas tremendo.
- É, porra! Deu a maior bandeira... agora esses podres vão vir pra cima da gente! – murmurou Pru.
- Bandeira dá essa tua cueca laranja. Dá pra ver isso a quilômetros! – disse Pi.
Os zumbis começaram a se arrastar em direção à banda. Alguns deles caiam e não conseguiam mais se levantar. Mesmo assim, se esforçavam para rastejar em direção aos músicos.
- CORRE CAMBADA! – gritou Fucho, saindo em disparada pela área que possuía menos zumbis.
Seus amigos não hesitaram e correram atrás do guitarrista. Com pouco passos ultrapassaram Fucho e continuaram correndo.
- Ei! Ei! Pô... peraí... arf... assim não pô...
Os quatro embrenharam-se num beco próximo. A ânsia de escapar era tanta que eles corriam alucinadamente e sem pensar.
Logo os integrantes da banda chegaram até uma cerca de madeira que media mais ou menos dois metros e meio, fechando o beco. Fucho arfava loucamente tentando puxar o oxigênio.
- Fudeu – disse Ze Luís.
- Quem teve a idéia de vir pra cá?- perguntou Pru.
- A tua mãe, claro. Não viu ela acenando pra gente? – disse Pi.
- Arf... Arf...
- E agora, Pi?
- Bora pular, claro.
- Bora. Zé, me levanta aí!
- Vai te fuder, Pru. Tá pensando o quê?
- Arf... Arf...
- Deixa de ser burro. Tu é único com força de levantar a gente.
- E quem me levanta?
- Ahn... o Fucho?
- O FUCHO? Putaquepariu, o Fucho não agüenta levantar nem o próprio corpo...
Grunhidos começaram a serem ouvidos vindo da entrada do beco. Os quatro se arrepiaram.
- Bora! Bora! – Pi saltitava nervoso.
- A gente tem que empurrar o Fucho primeiro – disse Pru.
- O quê? – espantou-se Zé Lucas.
- Tá doido, Pru? Comeu cocô?
- Bora! Bora!
- Arf... Arf...
- Olha aí o coitado... não vai conseguir pular isso nem com reza braba... – murmurou Pru olhando o obeso amigo arfante.
- Vem cá, Pru... – chamou Zé Lucas.
- Hm?
- Responde uma coisa...
- O quê?
- Tu tá pegando o Fucho?
- m-mas... que filhodaputa!
- Já manjei... fica nervoso não...
- As senhoras querem trocar confidências mais tarde? Agora a gente ta prestes a ser comido! – disse Pi, pálido e saltitante.
Os grunhidos seguiam agora do irritante ruído de pés arrastando, numa marcha lenta e inexorável. Pelo murmúrio das vozes, eles calcularam que pelo menos vinte zumbis estavam se aproximando.
- Já sei! Fucho, entra nessa caçamba de lixo e fica quieto. A gente pula, eles não vêem nada e a gente volta pra te pegar – elaborou Pi.
- Na caçamba? Tá doido? Vocês pulam e eu fico aqui com essas coisas? – protestou Fucho.
- Tu consegue pular? Não, né, pesadão? – disse Zé Lucas.
- Te falei que a gordura ainda ia te matar... – disse Pru.
- Grande conselho pra uma hora dessas, valeu mesmo... tu é meu irmão... meu chapa... meu...
- Cala a boca e entra nessa porra! – ordenaram os três à Fucho.
Os três levantaram Fucho desajeitadamente, segurando-o pelas pernas e bunda. Num impulso, empurraram o guitarrista caçamba adentro. Fucho caiu pesadamente sobre a montanha de papéis, restos de comida e sacos plásticos com sabe Deus o quê. Afundou as mãos numa coisa pastosa e teve medo de olhar o que era.
- Ah, Deus... tomara que isso seja pudim...
- Afunda aí, Fucho. Te esconde! – disse Pru.
Fucho estava quase chorando quando afundou a cara no lixo. Com as mãos arremessava sacolas e entulho sobre sim mesmo, buscando cobrir-se com o que tinha à mão.
Os outros três integrantes do Delete correram e saltaram a cerca rapidamente. Caíram bruscamente do outro lado. Deram sorte. Era o jardim de uma residência e estava vazio.
- Quietos agora... – disse Pi, sinalizando com a mão.
Em silêncio, os três agacharam-se e encostaram-se na cerca. Pru encontrou uma brecha entre as grossas tábuas e ficou observando a cena.
Os zumbis aproximavam-se lentamente. Eram cerca de quinze deles. Pru visualizou bem os primeiros. Um deles eram um homem idoso, vestido com um paletó surrado e manchado de sangue. Ele não possuía maxilar e arrastava a perna esquerda sem pé. Atrás dele vinha uma mulher jovem, loura, vestida como uma executiva. Havia sangue em seu cabelo e rosto, escorrendo sobre o blazer azul. Seus olhos eram brancos e revirados para trás.
Logo em seguida, o grupo de mortos-vivos era composto por uma variedade de tipos, desde um asiático vestido como sushiman até um garoto de aproximadamente onze anos, ainda carregando a lancheira escolar, de onde apareciam os dedos de uma mão guardada como se guarda um lanche.
Os zumbis avançavam lentamente em direção ao fundo do beco, sem a menor noção de que havia uma cerca ali. Fucho tremia feito vara verde dentro da caçamba de lixo e rezava para não ser visto.
Um zumbi moreno e forte trombou com a caçamba de lixo. Parou, tentou seguir e trombou mais duas vezes. Então tateou a borda da caçamba e fez força para subir.
Ergueu metade do corpo.
E então caiu para dentro da caçamba.
Pi, Zé Lucas e Pru prenderam a respiração.
Dentro da caçamba, o zumbi caíra exatamente sobre Fucho. O membro mais “fofinho” da Delete cerrou os dentes para conter um grito. Sentiu o zumbi movimentar-se desajeitadamente sobre ele, tentando levantar-se. O zumbi colocou-se de joelhos sobre as costas de Fucho e tentou um impulso para levantar-se. Não teve forças. Voltou a cair sentado sobre o guitarrista.
Fucho não resistiu e soltou um gritinho abafado.
O zumbi olhou em volta aturdido. Apoiou as mãos no lixo para equilibrar-se e percebeu a carne macia abaixo de si. Cutucou com o dedo indicador a bunda de Fucho, como quem analisa uma fruta no mercado.
- HUAAAAAAAA!!! – gritou Fucho dando um salto.
O lixo voou pra todos os lados. O zumbi foi empurrado para um canto da caçamba.
- SOCORROOOOO!!! – berrou Fucho.
Os demais zumbis voltaram sua atenção para a caçamba e ergueram suas mãos esqueléticas e semi-devoradas para agarrar Fucho. O guitarrista dava chutes tentando afastar as bocas famintas.
Os amigos de Fucho ficaram estarrecidos.
- FUDEU! FUDEU! – gritava Pi.
- Caracas, esses zumbis parecem as nossas fãs... – murmurou Zé Lucas.
- FUCHOOOOO!!!! – gritou Pru.
Fucho chutava violentamente os zumbis.
Até que sentiu uma mordida na bunda.
- HHHHUUUUUUAAAAAAAAAA!!!!
O zumbi que estava na caçamba havia aproveitado a distração de Fucho e o mordera, rasgando um naco de carne bem grande da bunda do colorido guitarrista.
Com a dor, Fucho hesitou. Os zumbis conseguiram agarrar as pernas do jovem e puxá-lo para fora da caçamba. Mal ele caiu no chão, já estava tendo seus braços, pernas e peito rasgados pelos dentes dos zumbis. Fucho gritava enlouquecido. Seus amigos assistiam impotentes àquela cena de pesadelo. Uma “montanha” de zumbis se formara para devorar Fucho.
- Fucho...
- Caralho...
- Buááááá...
Assistiram a morte do amigo por cerca de um minuto antes de saírem do transe.
- P-pessoal...
- Quié, Pi?...chuinf... – Pru soluçava.
- Bora sair daqui. Logo essas coisas acham a gente e aí a gente se fode igual ao Fucho – disse Pi.
- Nenhum zumbi vai me comer não! – protestou Zè Lucas – Eu dou porrada neles!
- Hm, se já passou o momento “macho-man”, bora pensar pra onde podemos ir, ok?
- Do avião deu pra ver uma ponte grande que levava pra fora da cidade... – lembrou Pru.
- E por quê a gente não pega um avião logo? – perguntou Zé Lucas.
- Tu sabe pilotar?
- Ahn...
- Pois é, idiota.
- A gente devia pegar um carro.
- Boa idéia, Pru.
- Mas olha essa fumaceira desgraçada... a cidade deve estar em chamas! – disse Zé Lucas olhando para as colunas de fumaça negra que subiam aos céus de vários pontos da cidade.
- Calma. Primeiro a gente acha um carro, depois foge pela ponte.
Os três começaram a caminhar pelo jardim, se afastando da cerca. Todos tremiam e estavam muito abalados pelos zumbis terem lanchado o Fucho. Andavam pé ante pé cruzando o jardim. Não viram nenhum zumbi no local.
Passaram em frente à porta dos fundos da casa e se dirigiram para a saída lateral, foi quando ouviram um grunhido.
- Gruuunnnhh...
Pararam congelados.
- Aimeudeus... – gemeu Pru.
- É zumbi! É zumbi! – disse Pi rangendo os dentes.
- Ahn... são as minhas tripas... tô com dor de barriga... – explicou Zé Lucas.
Pi deu um tapão na cabeça de Zé Lucas. Continuaram a caminhada e dobraram a lateral da casa. Cautelosamente correram até o portão que os separava da rua e observaram o movimento. Não notaram nenhum morto-vivo nas proximidades. Saíram para a rua e puderam ver alguns zumbis se arrastando no fim quarteirão seguinte.
- Por ali não dá pra ir – disse Pru.
- Olha lá! Um cyber café! – notou Pi.
- E isso é hora de querer entrar no Orkut?
- Que Orkut coisa nenhuma, idiota! A gente pode pedir socorro pelo telefone ou pela net! – disse o vocalista.
- A gente pode chamar a polícia! O exército! Os fuzileiros navais!! – disse Pru, imaginando um resgate heróico.
- Aff...
Os três entraram bem devagar no cyber. Alguns computadores estavam ligados e seus monitores emitiam um brilho monótono. À primeira vista não havia ninguém ali. Apressaram o passo e trancaram a porta atrás de si.
- Bora colocar alguma coisa aqui pra fechar essa porta – disse Pi.
- Vamos empurrar a banca dos pcs e escorar aqui... – imaginou Zé Lucas.
- Se botarem a mão em qualquer coisa, eu estouro a cabeça de vocês! – disse uma voz enérgica vindo dos fundos da lan.
Com as canelas batendo os três músicos encararam o dono da voz.
Apontando um rifle de caça diretamente para eles estava um homem gordo e suado, com expressão paranóica.
- Ai, jizuis... – murmurou Pru.
- Eu quero a minha mãe... – disse Pi.
- Gruuunnnhh... – disseram as tripas de Zé Lucas.
O homem apontava a arma e sorria maliciosamente.
- Se-senhor... precisamos de a-ajuda... – disse Pi tentando controlar o medo.
- Ajuda é?- repetiu o homem armado.
- É-é... a gente... pode usar seu telefone? – pediu Pru.
- Meu telefone é?
- E o seu banheiro... unf... se não for incômodo... – pediu Zé Lucas segurando a barriga.
- É, telefone... Pra chamar a polícia... tá cheio de zumbi lá fora! – disse Pi.
- Não podem usar PORRA NENHUMA! – gritou o homem.
- M-mas...
- O mundo SE FUDEU! Eu finalmente não tenho que aturar tipos como vocês! – disse o homem engatilhando a arma.
Os três músicos coloridos recuaram até a porta. O homem avançou.
- Anos... ANOS... aturando idiotas como vocês! Moleques com esses cabelos estranhos, essas roupas com cores horríveis, analfabetos, imbecis... Agora posso mandar todos PRO INFERNO! BWAHAHAHHAHAHA... – o homem apontou a arma para os músicos.
- ELE TÁ LOUCO!
- CORRE POVO!!
- GRUUUNNNHHH...
Os membros da Delete passaram pela porta correndo como uma revoada de borboletas descontroladas. Atrás deles um tiro ecoou por sobre suas cabeças e estraçalhou o luminoso do cyber.
O homem saiu também pela porta e começou a fazer nova mira nos coloridos, o que não era muito difícil devido às cores berrantes que usavam.
Atraídos pelo som do disparo, alguns zumbis começaram a se aproximar do cyber. O homem voltou sua atenção para eles e começou a atirar.
- Venham, seus idiotas! VENHAM! BWAHAHAHAHAHHAHAHAHAH...
Os coloridos continuaram correndo até não poderem mais ouvir a risada maníaca do homem da lan. Dobraram a primeira esquina que encontraram.
Ofegantes, pararam de correr no meio da rua.
- Arf... arf...
- O-olhem... estamos SALVOS! – disse Pru.
Zé Lucas e Pi levantaram as cabeças e olharam na direção em que o amigo apontava. Ali estava a delegacia de Santa Fé.
- Sabem o que isso significa? Armas! – disse Pi com um brilho estranho no olhar.
- E você vai poder ir ao banheiro, Zé!
- Agora não preciso mais...
Logo o mau cheiro invadiu as narinas de todos.
- Zé... tu é nojento... – disse Pi tapando o nariz.
- Porra, mó vacilo... – reclamou Pru.
- Ah é? Vacilo é? Tenta fugir com dor de barriga de um maníaco armado! Tenta, vai!
Um murmúrio chamou a atenção dos três desesperados. O murmúrio já conhecido dos zumbis se arrastando em direção a eles.
- Pra delegacia, galera! – gritou Pi.
Entraram correndo no prédio, esquecendo momentaneamente que poderiam haver zumbis lá dentro. A delegacia estava bem iluminada, mas parecia que havia acontecido uma rebelião ali, pois todos os móveis estavam revirados e haviam muitos papéis jogados a esmo.
- Cadê os cana? – perguntou Pru.
- Porra, nem no dia do juízo final a polícia trabalha? – reclamou Zé Lucas.
- Devem ter corrido quando sentiram esse teu cheiro de flores do campo... – resmungou Pi abanando a mão em frente ao nariz.
- De qualquer jeito, tenho que achar o vestiário dos caras. Pode ser que haja alguma roupa lá que eu possa usar – disse Zé Lucas olhando em volta.
- Deve ser por aquele corredor... – disse Pru apontando por um corredor nos fundos do salão da recepção.
- Bora dar uma olhada por aí... quero pôr as mãos numa arma... – decidiu Pi.
Os três entraram por um corredor amplo até chegarem a uma porta gradeada. A porta estava destrancada e eles resolveram entrar. Chegaram num pátio interno da delegacia. De repente ouviram vozes:
- Abre aqui!
- Socorro!
- Aqui! Aqui!
Entreolharam-se assustados.
- Não podem ser zumbis... zumbis não falam, só gemem e grunhem – disse Pi.
- Vem dali daquele corredor – apontou Zé Lucas.
- Devem ser... os presos! A polícia deve ter caído fora e largaram os caras aqui! – concluiu Pru.
- Pode ser. Eles podem dar a dica de onde estão as armas, né? – disse Pi.
- Tá doido? Quer ir lá com esse povo? É gente baixa, rude e violenta! – reclamou Zé Lucas.
- Esquece essa gentalha. Bora procurar nós mesmos as armas! – disse Pru.
- É, pensando bem, que se fodam esses marginais... – concordou Pi.[1]
Vasculharam as salas ignorando os pedidos de socorro. Zé Lucas correu para o banheiro e logo após rapidamente encontraram o vestiário dos policiais, onde Zé Lucas achou um macacão da divisão anti-tumulto do seu tamanho.
- Ah, agora sim... limpinho... – suspirou Zé Lucas.
- Tá uma merda – disse Pru.
- Hein? Onde? Mas eu me limpei! – protestou o baterista.
- Não. Tá uma merda essa cor cinza aí... sem graça... – disse Pru com expressão de desagrado.
- É... não tem outro, tipo... verde fosforescente? – sugeriu Pi.
- Já mandei vocês tomarem no...
O som de tiros ecoou pela delegacia. Os três estremeceram apavorados.
- AHHHH!!- gritou Pru histericamente.
- Bora pegar umas armas! – gritou Pi.
- Onde? Onde?
Os músicos entraram correndo na última sala que faltava ser vasculhada, justamente a sala de armas. Encontraram alguns rifles pendurados em ganchos na parede, mas protegidos por uma grade bem resistente, com um cadeado mais forte ainda.
- A gente não devia ter levantado da cama hoje... – resmungou Zé Lucas.
- A gente devia ter ido embora dessa cidadezinha ontem mesmo... – disse Pi, rangendo os dentes.
- A gente nem devia ter vindo pra cá... – choramingou Pru.
- Não tem jeito da gente pegar essas armas aí. Pela cara dessa grade, a gente vai levar a vida toda tentando – concluiu Pi.
- ...e a nossa vida vai ser bem curta se continuarmos aqui. Bora cair fora!
- Tô contigo, Zé! Bora!
Esgueiraram-se de volta pelos corredores buscando a saída.
Um novo tiro foi ouvido, vindo exatamente da entrada.
- Fudeu! Os presos devem ter escapado e tão se matando na saída!
- Não tem jeito, Pru. A única entrada e saída é por ali!
- Que cadeia escrota...
- A gente sai correndo e foda-se!
- Esse é teu plano?
- Na verdade meu plano é fazer você tropeçar e deixar esses estupradores interioranos se divertirem contigo enquanto eu fujo...
- Fidamãe...
- Que falta faz o Fucho...
- Pois é...
- ... assim ELE poderia tropeçar no meu lugar...
- A gente chora a falta dele depois! BORA CORRER!!!
E assim fizeram. Desembestaram numa correria louca, digna de um campeonato de gazelas. Chegaram até a metade do hall de entrada quando tiveram uma visão que os paralisou.
Um homem moreno, com aproximadamente um metro e noventa de altura, com cerca de cento e trinta quilos, vestindo um macacão sujo de graxa e óleo, segurava uma escopeta e disparava contra alguma coisa do lado de fora. O homem rangia os dentes e tinha seus olhos vermelhos de fúria.
- Uia!
- Quem é?
- Que homem!
Assustado pelas vozes dos coloridos, o homem apontou para eles a arma e por pouco não disparou.
- Quem são vocês, seus filhos da puta?! – berrou histérico.
- NÃO ATIRA PELAMORDEDEUS!! – implorou Pi.
- Somos da banda Delete! – gaguejou Pru.
- Nunca ouvi falar! – disse o homem alternando a mira entre os coloridos e os zumbis do lado de fora.
- Caipira ignorante... – murmurou Zé Lucas.
- O QUÊ?! – o homem atirava freneticamente abatendo os zumbis que se aproximavam.
- Calma! Calma! Nós somos gente! Não zumbis! – disse Pi levantando os braços.
- Tecnicamente zumbis também são gente... a diferença é que estão mortos... – pensou Pru.
Percebendo que os coloridos, apesar de seu aspecto, também eram pessoas vivas, o homem relaxou e preocupou-se em manter os zumbis distantes.
- Certo! Certo! Entendi!
- E quem é você? Polícia? – perguntou Pi.
- Não. Eu sou mecânico. Meu nome é Tião.
- Ajuda a gente, Tião!
- Não consigo ajudar nem eu mesmo! É o fim do mundo!
- Mas você ta armado! A gente tem só nossos... músculos?
Tião olhou para os músicos de cima a baixo.
- É... vocês tão fodidos mesmo...
- Você pode arrombar a grade do depósito de armas! Aí a gente pega umas e sai fora desse inferno! – sugeriu Pi.
- Eu tô com meu guincho ali fora! Vim aqui procurar ajuda da polícia! – disse Tião.
- Chegou tarde! A polícia se mandou e deixou só os marginais lá dentro – disse Zé Lucas.
- Salva a gente, seu Tião! Salva a gente! – implorou Pru.
- Porra! Tá! Os mortos-vivos tão afastados agora. A gente pode correr até o guincho! – disse Tião.
- Ok! Ok!
Os quatro preparam-se. Tião olhou para dos dois lados da rua, certificando-se de que havia um caminho livre. Alguns zumbis se arrastavam a cerca de vinte metros do guincho.
- CORRE!!! CORRE!!! – gritou Tião, saindo porta a fora.
Os músicos o seguiram correndo. Pru tropeçou e foi ao chão, batendo a cabeça no asfalto.
- HUNF!!!
Pi e Zé Lucas chegaram ao guincho no momento em que Tião entrava pelo lado do motorista.
- Levanta Pru! – gritou Pi entrando na cabine do caminhão guincho.
O guitarrista tentou levantar-se mas ainda estava muito zonzo. Os zumbis aproximavam-se salivando. Um dos mortos-vivos mais próximos vestia uma camiseta do Capitão América bastante suja de sangue.
Pru ergueu-se sobre os dois braços. Sua cabeça doía e ele havia perdido a noção da direção pra onde devia correr.
O “Capitão América” caiu no chão quando uma de suas pernas carcomidas partiu-se abaixo do joelho. Sua cabeça ficou a um metro e meio da perna de Pru. Como se sentisse o cheiro da carne do músico, ele começou a rastejar em direção à vítima. Sua saliva caía no asfalto quente. Seus olhos leitosos reviravam a esmo, dando um aspecto ainda mais grotesco à sua face semi-devorada.
O zumbi estrelado recebeu um tiro de escopeta na cabeça que espalhou o que restava de seus miolos pela rua.
De pé, próximo ao guincho, Tião segurava a arma ainda fumegante.
- CORRE! – gritou o mecânico.
- M-meu herói! – disse Pru, levantando-se.
Tião retornou ao volante do guincho, enquanto Zé Lucas ajudava Pru a subir na cabine.
Mais quatro zumbis uniformizados como militares tropeçaram e caíram sobre o corpo do “capitão”, fazendo um montinho. Tião arrancou com o guincho.
Tião dirigia como um louco. Manobrava por entre os zumbis sem se importar com aqueles que esmagava pelo caminho. Os corpos semi-devorados dos mortos-vivos esfacelavam-se contra o pára-choque do guincho.
- Pra onde a gente ta indo? – perguntou Zé Lucas.
- Em frente! Em frente! – grunhiu Tião.
- Em frente pra onde? – insistiu Pi.
- Sei lá, porra! Em frente até não ver mais nenhuma dessas coisas! – berrou Tião.
- O cara ta em pânico, Pi – cochicou Pru.
- Aham... peraí... ô, seu Tião...
- QUE FOI??
- Não seria melhor a gente ir pra ponte e de lá sair da cidade?
- Ponte? Ah é! A ponte!
Tião deu uma guinada brusca, entrando na rua à esquerda. Era uma rua elevada e de lá eles podiam ter uma boa visão da parte baixa da cidade. Nuvens negras de vários focos de incêndio subiam aos céus. Ao longe puderam ouvir uma explosão. Era um dos postos de gasolina que havia ido pelos ares arremessando zumbis aos pedaços por todo lado. Em todas as ruas haviam zumbis perambulando. Em algumas delas, verdadeiras multidões de mortos-vivos impediam qualquer tentativa de passagem.
- O caminho direto ta bloqueado! – disse Tião – A gente vai ter que contornar pela orla.
- Sem problemas, chefia – disse Zé Lucas.
Tião acelerou e desceu a rua. Faltando dois quarteirões, o grupo de sobreviventes deu de cara com um tiroteio.
As balas voavam de ambos os lados da rua. O guincho foi pego no fogo cruzado, obrigando todos a se abaixarem.
- Que merda é essa?? Zumbi atirando?- berrou Zé Lucas.
Pi levantou um pouco a cabeça e pôde observar que aqueles disparos eram feitos por vivos. Dezenas de homens e mulheres armados abrigavam-se dentro das lojas e casas e abriam fogo contra as pessoas do outro lado da rua.
- O povo endoidou! Tão se matando! – disse o vocalista.
- É o fim do mundo! Eu disse... – resmungou Tião, tentando dirigir sem expor demais a cabeça.
- Para essa porra, Tião! PARA! – berrou Pru.
- O QUÊ? Parar aqui? Tá doido? – contestou o mecânico.
- PARA PORRA! – exigiu o guitarrista.
Sem entender nada, o mecânico freou o guincho. Os atiradores cessaram o fogo, curiosos com aquela súbita parada.
Pru ergue-se e pôs metade do corpo pra fora da janela da cabine. Seus amigos tentaram detê-lo mas ele chutou até conseguir se posicionar.
- Ei! Ei! Pessoal! Parem com isso! Estamos enfrentando zumbis! Não faz sentido vocês se matarem!! Vamos nos unir e escapar juntos!!! – berrou o colorido.
Seguiu-se um silêncio sepulcral. As pessoas observavam Pru com incredulidade até que...
- Ei! É a BANDA DELETE! – berrou alguém.
- Tá vendo, Pi? Eles nos conhecem! Tá tudo bem... – disse Pru com um sorriso largo no rosto.
- O DOBRO DE PONTOS PRA QUEM ACERTAR ESSES IDIOTAS!!!
- “O dobro de...”????
A chuva de balas varreu o guincho. Pru ficou tão furado quanto um escorredor de arroz e tombou pra fora do caminhão.
Tião acelerou e fez o caminhão cantar pneu.
- Atiraram na gente! NA GENTE! – berrou Zé Lucas em pânico.
- Desgraçados! Acabaram com o Pru!... – chorava Pi.
- Malditos fãs de MPB!!!
Dobraram à direita dois quarteirões depois entrando na avenida da orla de Santa Fé. Os fugitivos viram vários zumbis em trajes de banho, circulando pelo calçadão.
- Isso é o inferno! – murmurou Pi, enxugando as lágrimas.
- Tem luzes ali no meio da ponte! – apontou Tião.
À medida que se aproximavam puderam perceber que havia uma barreira no meio da ponte contendo alguns zumbis. Do outro lado da barreira, um grupo de militares parecia disparar contra os mortos-vivos.
- Se segurem! – disse Tião.
O guincho entrou na ponte cantando pneu e por pouco não tombou. Os músicos gritaram como menininhas histéricas, enquanto Tião gargalhava como um louco. Atraídos pelo barulho do guincho, vários zumbis se voltaram para o veículo, e tentavam agarrá-lo inutilmente. Tião arrastava os zumbis com seu caminhão e não se detinha por nada.
Ou quase nada.
Um zumbi obeso, com cerca de duzentos quilos de carne podre surgiu em frente ao guincho.
- Não acredito... – murmurou o mecânico.
Tião jogou o veículo para esquerda tentando desviar do zumbi-baleia. Não conseguiu de todo. Bateu lateralmente no morto-vivo e tombou com o guincho, esmagando a montanha de carne. O mecânico e os músicos foram violentamente sacudidos dentro da cabine.
Instantes preciosos se passaram até que os três conseguissem se recuperar minimamente e pensarem em sair do guincho.
Os zumbis cercaram o veículo.
- F-fudeu... Pi... – gaguejou Zé Lucas.
- É o fim, Zé... o fim... – concordou Pi.
- Sabe o que mais me incomoda em morrer assim?
- O quê, Zé?
- É que eu... eu... gosto mesmo é de metal... Entrei nessa de colorido pra ganhar uma grana...
- ...
- E vou morrer... com essa fama de borboleta...
- Fidaputa...
Um grito enlouquecido fez gelar as veias dos coloridos. De pé, sobre a cabine tombada do guincho, Tião fazia sua escopeta cuspir chumbo sobre os zumbis.
- HHHHUUUUUAAAAAAAAAAAAAA!!!
Despertos pela loucura de Tião, os dois músicos puxaram-se para cima da carcaça do guincho. Os zumbis grunhiam e babavam litros de gosma, antecipando o banquete.
- TOMEM CHUMBO SUAS CRIAS DO INFERNO!!! – berrava Tião, salivando tanto quanto os zumbis.
- O Tião endoidou de vez... – disse Zé Lucas.
- Ele já tava por um fio faz tempo... – concordou Pi.
Pi olhou em volta e teve uma idéia.
- Ei, Zé! A gente pode pular pra amurada da ponte!
- Porra! É mesmo!
- Ei, Tião!
- MOOOOORRRAAAMMMM BESTAS-FERAS DAS PROFUNDEZAAAASS!!!
- Tião!
- VOLTEM PRO CAPETA, MONSTROS DO INFERNOOOOO!!!!
- Tião?
- TOMEM BALAAAAAAAA CRIATURAS NOJENTAAAAAAASSS!!!
- Bora, Zé...
Pi e Zé Lucas saltaram para a amurada. Quase caíram no rio abaixo, mas conseguiram se equilibrar a tempo. Tião continuava louco e surdo ao chamado dos músicos. Dois zumbis conseguiram escalar o guincho e agarraram os pés do mecânico. Tião chutou-os e tentou atirar, mas estava sem balas e a escopeta fez apenas um “CLEC” inútil.
Uma linha de suor frio escorreu pelas costas do mecânico.
Um dos zumbis agarrou a perna de Tião e puxou-o para baixo. O mecânico gritava e esmurrava os zumbis alucinadamente, mas logo foi sobrepujado por cerca de dez dos mortos-vivos que caíram sobre ele.
- TIÃO! – berraram os coloridos.
O som das dentadas dos zumbis no corpo de Tião podia ser nitidamente ouvido, juntamente com os grunhidos de satisfação da horda.
- Não dá pra fazer nada, Pi... A gente tem que alcançar a barreira do exército! – disse Zé Lucas.
- Tião... chuinf... vou fazer uma música pra ti... aham... “Aonde quer que eu vááá, te levo comigoooo...”
- DEPOIS! DEPOIS! CORRE! – gritou Zé Lucas.
Os zumbis perceberam os dois coloridos sobre a amurada e começaram a voltar sua atenção para eles. Sem perder tempo, os músicos começaram a andar o mais rápido que podiam em direção aos militares que estavam posicionados a cerca de cem metros.
- Ai, caramba... espero que eles não atirem na gente! – disse Zé Lucas buscando equilibrar-se.
- Temos fãs no exército? – perguntou Pi.
- Ahn... er...
- Estamos fodidos...
Na barreira feita pelo exército, dezenas de militares haviam estabelecido um perímetro de segurança e mantinham os zumbis distantes com a ação de franco-atiradores. O capitão Magalhães chefiava a operação e observava o movimento na ponte com um binóculo. O sargento Zaqueu aproximou-se do capitão.
- Estamos conseguindo contê-los por enquanto, senhor. Mas se vierem em um bando muito grande... – informou o sargento.
- É, já percebi... logo vamos isolar de vez esta ponte e recuaremos – disse o capitão – Mas, espere... que diabos é aquilo lá?
O sargento apanhou outro binóculo e olhou na direção que o capitão indicava.
- Deus! Eles estão evoluindo, senhor... Já conseguem se equilibrar na amurada!
- Maldição! Temos que derrubá-los dali!
- É pra já, senhor!
O sargento apanhou seu rádio-comunicador e acionou a freqüência dos atiradores de elite.
- Espere! – disse o capitão.
- Pois não, senhor?
- Um deles está vestido como um policial local... e o outro é horrivelmente colorido...
- Colorido, senhor?
- E parecem inteiros...
- Devemos atirar, senhor?
- Deixe-me pensar...
Zé Lucas e Pi caminhavam pela amurada. Alguns zumbis vinham se aproximando lentamente e eles acelerara o que puderam. De um lado, os zumbis aguardavam, de outro, o rio centenas de metros abaixo.
- O Fucho fez bem em morrer logo... – murmurou Pi.
- Que diabo você tá dizendo? – resmungou Zé Lucas.
- Ele jamais ia conseguir se equilibrar aqui...
Disparos foram ouvidos. Balas cortaram o ar na direção dos coloridos.
E atingiram os zumbis mais próximos da dupla.
- Estão nos dando cobertura! – berrou Zé Lucas.
- Estamos SALVOS! – gritou Pi.
Os zumbis foram abatidos com precisão. Os dois músicos chegaram até a barreira e saltaram para o meio da ponte, buscando a entrada.
- PRO CHÂO! CHÃO! AGORA! – ordenou o soldado mais próximo apontando uma metralhadora para os músicos.
Sem discutir, ambos se jogaram no solo. Foram revistados por dois soldados, que constataram que eles não possuíam sinais da infecção zumbi. Foram encaminhados ao capitão Magalhães.
- Capitão, não temos como lhe agradecer! – disse Pi apertando a mão do militar com euforia.
- Agradeçam ao cabo Cordovil, um de nossos atiradores de elite. Ele é um de seus fãs e os reconheceu na ponte.
- Eu te disse que a gente tinha fã no exército... eu te disse... – murmurou Pi em direção à Zé Lucas.
- Aff...
Uma hora depois, um helicóptero pousava no acampamento do exército trazendo Silvio Acatauassu, o empresário da banda Delete.
- Que isso, moçada? Mando vocês sozinhos pra um show e acontece toda essa desgraça? – diz Silvio sorrindo.
- Silvio! Tu é um filhodaputa! Como não veio socorrer logo a gente? – pragueja Zé Lucas.
- Aham... tive contratempos... – diz Silvio, pensando no material de divulgação do que seria o “álbum póstumo” da banda Delete indo pelo ralo – o que importa é que vocês estão aqui e podemos continuar a turnê!
- Continuar como? O Fucho e o Pru se fuderam! – diz Pi.
- Ora, vamos fazer um concurso em rede nacional pra encontrar novos talentos que entrem na vaga deles, é lógico! Audiência na certa!
- Tu é um tremendo dum escroto, cara... – disse Zé Lucas.
- Sou bem pago pra isso! Agora vamos daqui.
- Silvio, tu não tem noção mesmo... o mundo se fudeu! Tá tudo louco! – disse Pi.
- E daí que o mundo tá cheio de zumbis? Antes as fãs também não corriam feito loucas atrás de vocês querendo um pedaço? Não mudou nada.
- ...
- Tu é realmente um escroto – reafirmou Zé Lucas.
- Ah, Silvio... tô com uma letra nova na cabeça... – disse Pi.
- Manda aí, moleque!
- “E eu vou te encontraaaaarrrr, aonde quer que eu váááá...”
- Genial! Sucesso!
E o helicóptero partiu levando os três.
FIM?[1] Para saber o que aconteceu na delegacia, continue lendo os capítulos seguintes da Frequência Z.