Ela é a maga número um de Las Vegas. Ele é o investigador do incomum conhecido como Dr. Oculto.Juntos eles formam os Sentinelas da Magia, um grupo dedicado a combater as ameças sobrenaturais que ameaçam o mundo.Venha conhecer suas fantásticas aventuras e veja o mundo com outros olhos.
Sentinelas da Magia #1
Quando a noite cai
por Alex Nery.
Cross Fell, norte da Inglaterra – 01:30h.
Os zumbidos dos insetos preenchem a noite. Na pequena cidade de King’s Cross, ninguém mais trafega por suas vielas. Há muito que seus moradores se recolheram, fugindo do frio e da escuridão. O vento noturno varre as calçadas estreitas, as novas ruas asfaltadas e as travessas da periferia, muitas ainda feitas de paralelepípedos.
Numa destas travessas periféricas, em uma casa pequena e confortável, situada no fim da rua, uma luz fraca e bruxuleante atravessa o vidro da janela. Dentro da casa, apesar de todos os compartimentos possuírem energia elétrica, um ambiente decorado com móveis simples e rústicos é iluminado parcamente pela luz de uma vela. Em sua cadeira de embalo preferida, a idosa proprietária da casa, Sra. Higgins, continua tecendo um longo manto de tricô.
Desde a morte de seu marido Harold, a Sra. Higgins dedicara-se cada vez mais à confecção de roupas e utensílios de tricô, que eram vendidos a preços baixos para toda a vizinhança. Agora, ela estava prestes à concluir sua maior peça, aquela que consumira mais tempo do que todas as outras, devido o cuidado que ela dedicara a cada ponto da trama. Concentrada em seu afazer, ela continuava distante dos acontecimentos ocorridos no restante da cidade.
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John Russel caminhava tropegamente pela calçada. Seus pés teimavam em competir entre si, fazendo-o cambalear às vezes para a direita, outras vezes para a esquerda. Sua visão era turva e insistia em dobrar a imagem à sua frente. Levou a garrafa à boca pela milésima vez e constatou, contrariado, que ela estava vazia. Arremessou a garrafa com violência contra a fachada de um prédio próximo e continuou tentando chegar em casa.
Não tinha tanta pressa em chegar, pois sabia que sua esposa o receberia com os costumeiros gritos e reclamações. Um ano de casado e já vivia um inferno em vida. Se não fosse pelo pequeno Junior, já teria largado tudo.
O enjôo em seu estômago cresceu, e ele cambaleou até o beco entre duas lojas. Encostou os braços junto à parede, baixou a cabeça e jogou fora tudo o que ainda possuía no estômago. Não conseguiu evitar sujar o paletó. Limpou os lábios com a costa da mão direita. Fedia como um gambá.
Mal notou o rosnado atrás de si. Virou-se instintivamente e já preparava um chute para o cachorro que estivesse por perto, quando percebeu não se tratar de um cachorro. Na verdade, não era nenhum animal que já tinha visto na vida.
Um homem o observava. E bem poderia ser um homem completamente pintado de vermelho, se não fossem pelos dentes amarelos e afiados, os olhos que pareciam buracos flamejantes e os enormes chifres retorcidos em sua cabeça.
Ainda assim, o pior de tudo era a risada. Um som gutural, horrendo e carregado de cinismo.
John não teve tempo de gritar. A criatura partiu-lhe em dois, arrancando suas vísceras com um golpe certeiro. Seu sangue tingiu o beco de vermelho e seu corpo caiu sem vida. A criatura ajoelha-se e satisfaz seu apetite com o corpo quente do pobre homem.
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São Francisco, Califórnia – EUA – 17:00h.
O Dr. Oculto observa o movimento na rua abaixo através da janela de seu escritório, situado no segundo andar do pequeno prédio de três andares. As pessoas se movimentam apressadamente, tentando chegar aos bares mais próximos para aproveitarem o fim de tarde junto com os amigos.
Ele olha para o sobretudo pendurado no cabide, juntamente com o chapéu, e se pergunta a quanto tempo não faz o mesmo. Porém, no instante seguinte, ele se lembra de que esses pequenos prazeres não fazem mais parte de sua vida.
Oculto apanha um livro da estante ao seu lado e senta-se na mesa. Começa a folhear distraidamente o volume até que, subitamente, ele é atingido por uma intensa dor de cabeça, e visões cortam seu cérebro. Imagens de dor e sofrimento.
O investigador místico larga o livro e eleva suas mãos. Ele pressiona suas têmporas, numa tentativa de focalizar melhor as imagens. Ignorando a dor, ele consegue ver uma placa de estrada, situada numa rodovia desconhecida:
“King’s Cross – Cross Fell County - 1,5 mile”
- King’s Cross?? – murmura o detetive – O que há de errado em King’s Cross?
As imagens e a dor desaparecem tão rapidamente como vieram, deixando-o perturbado. Sem pensar duas vezes, o Dr. Oculto apanha seu sobretudo marrom e o chapéu, vestindo-os rapidamente. Ele sabe melhor do que ninguém que esse tipo de “chamado” deve ser prontamente atendido, caso contrário, vida humanas podem se perder. Ele retira do bolso um disco com faixas vermelhas e negras e estende o braço para frente.
- O mal caminha em King’s Cross... – responde ele para si mesmo.
O disco gira e cria uma fenda no ar, grande o suficiente para que ele possa atravessá-la, mergulhando em outra dimensão.
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King’s Cross, norte da Inglaterra – 02:45h.
Jerry apanhou as chaves do quarto de maneira desajeitada, quase deixando-as cair. Esticou a mão trêmula e entregou-as à moça morena que aguardava com um sorriso. Ela agradeceu, virou-se e caminhou para o elevador. Em todos esses anos como recepcionista do único hotel de King’s Cross, Jerry jamais havia visto uma mulher tão bonita. Ele tinha certeza de já tê-la visto em algum lugar, mas não lembrava de onde. Seria da TV? Talvez não. O que alguém realmente famoso faria em King’s Cross àquela hora da madrugada?
A porta do elevador abriu, mas a moça não entrou. Ela vira-se mais uma vez e diz:
- É provável que alguém me ligue ainda hoje. Por favor, anote os recados e diga que mais tarde eu entro em contato, ok?
- S-sim, Srta. Zatanna. Pode deixar – respondeu Jerry. O olhar dela o intimidava. Era como se ela pudesse perceber toda a excitação que ele sentia.
Zatanna entrou no elevador e apertou o botão do primeiro andar. Estava cansada. Trazia na mão uma pequena mala, onde encontrava-se apenas a varinha que utilizava constantemente nos shows. Perguntou-se quanto tempo o recepcionista levaria para descobrir quem ela era. Não se dera ao trabalho nem de usar um nome falso e mesmo assim o pobre coitado ainda não juntara as peças.
Talvez mais tarde, quando o sono lhe tivesse passado, ele percebesse que ela era Zatanna Zatara, a famosa mágica norte-americana que agora estava em turnê pela Inglaterra. Mas ela pretendia sair da cidade antes que ele tivesse tempo de informar sua localização a algum dos tablóides ingleses. Na verdade, ela não sabia bem o porquê de ter insistido em passar o restante da noite nesta cidadezinha perdida. Michael, seu empresário, ia ficar furioso, mas ela havia aprendido a dar ouvidos a esta intuição especial que vez ou outra a conduzia a algum lugar estranho. Já escapara de um acidente aéreo e de uma tentativa de seqüestro seguindo seus instintos. E além disso, ela tinha sua varinha. Não era, de modo algum, uma pessoa indefesa.
A porta do elevador se abriu, dando-lhe passagem para o corredor do primeiro andar. Ela caminhou lentamente até o quarto 104 e abriu a porta. A suíte possuía uma decoração simples, mas era muito limpo e arrumado. A grande cama de casal parecia lhe dar as boas-vindas. Zatanna jogou-se nela, de braços abertos.
Tomou um banho rápido, vestiu um pijama leve e retornou para a cama. Não sentia fome alguma, então apagou as luzes, deitou-se e dormiu.
Por um tempo indefinido dormiu tranquilamente, porém, um movimento na escuridão do quarto a despertou. Permaneceu quieta na cama, fingindo dormir, observando em volta com os olhos semi-cerrados. Novamente ela percebe que há mais alguém no quarto, provavelmente um ladrão, movimentando-se sorrateiramente próximo ao guarda-roupa. Zatanna tateia sob a colcha da cama e apanha sua varinha.
O vulto se move em direção à porta e ela senta-se na cama, erguendo a varinha à sua frente, num gesto desafiador, e recita:
- Odarap!
O vulto fica imobilizado. Zatanna levanta-se da cama e invoca novo encanto:
- Es-Açaf a zul!
Um ponto luminoso sai da varinha e flutua sobre a feiticeira, iluminando todo o quarto. A luz revela o Dr. Oculto, que parece constrangido por ter sido pego.
- Quem é você? – pergunta Zatanna.
- Meu nome é Dr. Oculto. Não pretendo lhe fazer mal algum.
- Ah, e por que está se esgueirando pelo meu quarto em plena madrugada?
- Procuro por algo, Zatanna Zatara. E as energias que persigo me trouxeram até você.
- Energias? Que energias? É algum tipo de maluco? Me conhece de onde?
- Você sabe bem do que estou falando. Srta. Zatara. Você também é uma adepta da arte.
- Da arte? Da mágica?
- Mágica, magia, feitiçaria, oculto... São tantos nomes, mas prefiro chamá-la de simplesmente “arte”.
- Sou apenas uma artista de salão...
- Uma simples “artista de salão” não poderia me paralisar, srta. Zatara.
Zatanna emudece por um instante, pensativa.
- Ok, vou te libertar. Mas se tentar qualquer coisa...
- Não tentarei.
- Es-avom!
Oculto ganha novamente o controle de seu corpo.
- Interessante. Você manifesta a arte através da linguagem. É um método antigo, senhorita – comenta o investigador.
- Meu pai me ensinou a fazer essas coisas... Na verdade, não compreendo muito bem tudo isso – diz Zatanna balançando a cabeça – Apenas uso um pouco em meus shows.
- A energia arcana é forte em você. Foi ela que me trouxe até seu quarto.
- Estava me procurando, Dr.?
- Não. Eu estou procurando outra fonte de poder mágico.
- Outra fonte? Aqui?? Deve ser por isso que tive uma sensação esquisita e decidi ficar esta noite nesta cidade...
- Talvez você tenha pressentido também o mal presente aqui.
- Mal? Não sei... Um mal-estar com certeza...
- Seja como for, devo partir, srta. Zatara. Tenho que encontrar esta fonte antes mais pessoas sejam vítimas deste mal.
- Vítimas? Que vítimas?
- Infelizmente, cinco pessoas desta cidade foram mortas esta noite.
- Oh....
- Desculpe tê-la incomodado. Tenha uma boa noite – Oculto inclina a cabeça, numa saudação cavalheiresca.
- Espere! – grita Zatanna.
- Ahn?
- Quero ir junto!
- Sinto muito, não posso leva-la. É arriscado.
- Arriscado? Arriscado é eu ficar sozinha aqui. Se você me achou, essa outra fonte pode me achar também.
O Dr. Oculto pensa por alguns instantes e por fim concorda.
- Está bem. Se você se sentiu inclinada a ficar aqui hoje, deve ter sido por algum motivo.
- Coincidência, talvez?
- Não existem coincidências para quem anda no caminho da arte. É uma das primeiras lições que aprendi.
Zatanna apanha uma mala e corre para o banheiro. Em minutos, ela volta vestida com sua melhor roupa de show: meias arrastão, uma mini-saia esvoaçante, uma blusa azul, um casaquinho de mangas longas e uma cartola típica dos mágicos.
- Não é uma roupa muito discreta – critica o Dr. Oculto.
- Não sou discreta. Sou uma artista! – replica a mágica.
- Hm, certo...
Oculto retira de seu bolso o seu amuleto mágico e abre um novo portal no ar. Ambos penetram na fenda, desaparecendo completamente. O ponto luminoso produzido por Zatanna desaparece no mesmo instante.
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Na periferia de King’s Cross, a Sra. Higgins termina o seu bordado. Ela se levanta e, com orgulho, abre a peça. Por alguns instantes ela permanece muda e sorridente, admirando sua obra. De repente, um barulho estrondoso vindo da rua chama sua atenção. Ela caminha apressadamente e olha através do vidro da janela fechada.
Criaturas sibilantes e asquerosas arrastam-se pela rua anteriormente vazia. Algumas possuem forma humanóide, outras sequer lembram qualquer animal terrestre. Algumas possuem olhos vermelhos e incendiários, outras emitem uma pálida luz mortiça através da pele alva. São dezenas, avançando em direção ao centro da cidade. Os gritos desesperados dos moradores de King’s Cross começam a preencher a escuridão noturna.
Será uma longa madrugada.
Continua...
No próximo número: King’s Cross é a mais nova representante do inferno na terra. E cabe ao Dr. Oculto e Zatanna derrotarem um mal secular, para que este não se alastre pelo mundo. Demônios! Caos! E a participação especial de um campeão da Ordem! É a nova era da magia que se inicia! Só aqui, no ULTIMATE UNF! Não perca!
Sentinelas da Magia #1
Quando a noite cai
por Alex Nery.
Cross Fell, norte da Inglaterra – 01:30h.
Os zumbidos dos insetos preenchem a noite. Na pequena cidade de King’s Cross, ninguém mais trafega por suas vielas. Há muito que seus moradores se recolheram, fugindo do frio e da escuridão. O vento noturno varre as calçadas estreitas, as novas ruas asfaltadas e as travessas da periferia, muitas ainda feitas de paralelepípedos.
Numa destas travessas periféricas, em uma casa pequena e confortável, situada no fim da rua, uma luz fraca e bruxuleante atravessa o vidro da janela. Dentro da casa, apesar de todos os compartimentos possuírem energia elétrica, um ambiente decorado com móveis simples e rústicos é iluminado parcamente pela luz de uma vela. Em sua cadeira de embalo preferida, a idosa proprietária da casa, Sra. Higgins, continua tecendo um longo manto de tricô.
Desde a morte de seu marido Harold, a Sra. Higgins dedicara-se cada vez mais à confecção de roupas e utensílios de tricô, que eram vendidos a preços baixos para toda a vizinhança. Agora, ela estava prestes à concluir sua maior peça, aquela que consumira mais tempo do que todas as outras, devido o cuidado que ela dedicara a cada ponto da trama. Concentrada em seu afazer, ela continuava distante dos acontecimentos ocorridos no restante da cidade.
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John Russel caminhava tropegamente pela calçada. Seus pés teimavam em competir entre si, fazendo-o cambalear às vezes para a direita, outras vezes para a esquerda. Sua visão era turva e insistia em dobrar a imagem à sua frente. Levou a garrafa à boca pela milésima vez e constatou, contrariado, que ela estava vazia. Arremessou a garrafa com violência contra a fachada de um prédio próximo e continuou tentando chegar em casa.
Não tinha tanta pressa em chegar, pois sabia que sua esposa o receberia com os costumeiros gritos e reclamações. Um ano de casado e já vivia um inferno em vida. Se não fosse pelo pequeno Junior, já teria largado tudo.
O enjôo em seu estômago cresceu, e ele cambaleou até o beco entre duas lojas. Encostou os braços junto à parede, baixou a cabeça e jogou fora tudo o que ainda possuía no estômago. Não conseguiu evitar sujar o paletó. Limpou os lábios com a costa da mão direita. Fedia como um gambá.
Mal notou o rosnado atrás de si. Virou-se instintivamente e já preparava um chute para o cachorro que estivesse por perto, quando percebeu não se tratar de um cachorro. Na verdade, não era nenhum animal que já tinha visto na vida.
Um homem o observava. E bem poderia ser um homem completamente pintado de vermelho, se não fossem pelos dentes amarelos e afiados, os olhos que pareciam buracos flamejantes e os enormes chifres retorcidos em sua cabeça.
Ainda assim, o pior de tudo era a risada. Um som gutural, horrendo e carregado de cinismo.
John não teve tempo de gritar. A criatura partiu-lhe em dois, arrancando suas vísceras com um golpe certeiro. Seu sangue tingiu o beco de vermelho e seu corpo caiu sem vida. A criatura ajoelha-se e satisfaz seu apetite com o corpo quente do pobre homem.
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São Francisco, Califórnia – EUA – 17:00h.
O Dr. Oculto observa o movimento na rua abaixo através da janela de seu escritório, situado no segundo andar do pequeno prédio de três andares. As pessoas se movimentam apressadamente, tentando chegar aos bares mais próximos para aproveitarem o fim de tarde junto com os amigos.
Ele olha para o sobretudo pendurado no cabide, juntamente com o chapéu, e se pergunta a quanto tempo não faz o mesmo. Porém, no instante seguinte, ele se lembra de que esses pequenos prazeres não fazem mais parte de sua vida.
Oculto apanha um livro da estante ao seu lado e senta-se na mesa. Começa a folhear distraidamente o volume até que, subitamente, ele é atingido por uma intensa dor de cabeça, e visões cortam seu cérebro. Imagens de dor e sofrimento.
O investigador místico larga o livro e eleva suas mãos. Ele pressiona suas têmporas, numa tentativa de focalizar melhor as imagens. Ignorando a dor, ele consegue ver uma placa de estrada, situada numa rodovia desconhecida:
“King’s Cross – Cross Fell County - 1,5 mile”
- King’s Cross?? – murmura o detetive – O que há de errado em King’s Cross?
As imagens e a dor desaparecem tão rapidamente como vieram, deixando-o perturbado. Sem pensar duas vezes, o Dr. Oculto apanha seu sobretudo marrom e o chapéu, vestindo-os rapidamente. Ele sabe melhor do que ninguém que esse tipo de “chamado” deve ser prontamente atendido, caso contrário, vida humanas podem se perder. Ele retira do bolso um disco com faixas vermelhas e negras e estende o braço para frente.
- O mal caminha em King’s Cross... – responde ele para si mesmo.
O disco gira e cria uma fenda no ar, grande o suficiente para que ele possa atravessá-la, mergulhando em outra dimensão.
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King’s Cross, norte da Inglaterra – 02:45h.
Jerry apanhou as chaves do quarto de maneira desajeitada, quase deixando-as cair. Esticou a mão trêmula e entregou-as à moça morena que aguardava com um sorriso. Ela agradeceu, virou-se e caminhou para o elevador. Em todos esses anos como recepcionista do único hotel de King’s Cross, Jerry jamais havia visto uma mulher tão bonita. Ele tinha certeza de já tê-la visto em algum lugar, mas não lembrava de onde. Seria da TV? Talvez não. O que alguém realmente famoso faria em King’s Cross àquela hora da madrugada?
A porta do elevador abriu, mas a moça não entrou. Ela vira-se mais uma vez e diz:
- É provável que alguém me ligue ainda hoje. Por favor, anote os recados e diga que mais tarde eu entro em contato, ok?
- S-sim, Srta. Zatanna. Pode deixar – respondeu Jerry. O olhar dela o intimidava. Era como se ela pudesse perceber toda a excitação que ele sentia.
Zatanna entrou no elevador e apertou o botão do primeiro andar. Estava cansada. Trazia na mão uma pequena mala, onde encontrava-se apenas a varinha que utilizava constantemente nos shows. Perguntou-se quanto tempo o recepcionista levaria para descobrir quem ela era. Não se dera ao trabalho nem de usar um nome falso e mesmo assim o pobre coitado ainda não juntara as peças.
Talvez mais tarde, quando o sono lhe tivesse passado, ele percebesse que ela era Zatanna Zatara, a famosa mágica norte-americana que agora estava em turnê pela Inglaterra. Mas ela pretendia sair da cidade antes que ele tivesse tempo de informar sua localização a algum dos tablóides ingleses. Na verdade, ela não sabia bem o porquê de ter insistido em passar o restante da noite nesta cidadezinha perdida. Michael, seu empresário, ia ficar furioso, mas ela havia aprendido a dar ouvidos a esta intuição especial que vez ou outra a conduzia a algum lugar estranho. Já escapara de um acidente aéreo e de uma tentativa de seqüestro seguindo seus instintos. E além disso, ela tinha sua varinha. Não era, de modo algum, uma pessoa indefesa.
A porta do elevador se abriu, dando-lhe passagem para o corredor do primeiro andar. Ela caminhou lentamente até o quarto 104 e abriu a porta. A suíte possuía uma decoração simples, mas era muito limpo e arrumado. A grande cama de casal parecia lhe dar as boas-vindas. Zatanna jogou-se nela, de braços abertos.
Tomou um banho rápido, vestiu um pijama leve e retornou para a cama. Não sentia fome alguma, então apagou as luzes, deitou-se e dormiu.
Por um tempo indefinido dormiu tranquilamente, porém, um movimento na escuridão do quarto a despertou. Permaneceu quieta na cama, fingindo dormir, observando em volta com os olhos semi-cerrados. Novamente ela percebe que há mais alguém no quarto, provavelmente um ladrão, movimentando-se sorrateiramente próximo ao guarda-roupa. Zatanna tateia sob a colcha da cama e apanha sua varinha.
O vulto se move em direção à porta e ela senta-se na cama, erguendo a varinha à sua frente, num gesto desafiador, e recita:
- Odarap!
O vulto fica imobilizado. Zatanna levanta-se da cama e invoca novo encanto:
- Es-Açaf a zul!
Um ponto luminoso sai da varinha e flutua sobre a feiticeira, iluminando todo o quarto. A luz revela o Dr. Oculto, que parece constrangido por ter sido pego.
- Quem é você? – pergunta Zatanna.
- Meu nome é Dr. Oculto. Não pretendo lhe fazer mal algum.
- Ah, e por que está se esgueirando pelo meu quarto em plena madrugada?
- Procuro por algo, Zatanna Zatara. E as energias que persigo me trouxeram até você.
- Energias? Que energias? É algum tipo de maluco? Me conhece de onde?
- Você sabe bem do que estou falando. Srta. Zatara. Você também é uma adepta da arte.
- Da arte? Da mágica?
- Mágica, magia, feitiçaria, oculto... São tantos nomes, mas prefiro chamá-la de simplesmente “arte”.
- Sou apenas uma artista de salão...
- Uma simples “artista de salão” não poderia me paralisar, srta. Zatara.
Zatanna emudece por um instante, pensativa.
- Ok, vou te libertar. Mas se tentar qualquer coisa...
- Não tentarei.
- Es-avom!
Oculto ganha novamente o controle de seu corpo.
- Interessante. Você manifesta a arte através da linguagem. É um método antigo, senhorita – comenta o investigador.
- Meu pai me ensinou a fazer essas coisas... Na verdade, não compreendo muito bem tudo isso – diz Zatanna balançando a cabeça – Apenas uso um pouco em meus shows.
- A energia arcana é forte em você. Foi ela que me trouxe até seu quarto.
- Estava me procurando, Dr.?
- Não. Eu estou procurando outra fonte de poder mágico.
- Outra fonte? Aqui?? Deve ser por isso que tive uma sensação esquisita e decidi ficar esta noite nesta cidade...
- Talvez você tenha pressentido também o mal presente aqui.
- Mal? Não sei... Um mal-estar com certeza...
- Seja como for, devo partir, srta. Zatara. Tenho que encontrar esta fonte antes mais pessoas sejam vítimas deste mal.
- Vítimas? Que vítimas?
- Infelizmente, cinco pessoas desta cidade foram mortas esta noite.
- Oh....
- Desculpe tê-la incomodado. Tenha uma boa noite – Oculto inclina a cabeça, numa saudação cavalheiresca.
- Espere! – grita Zatanna.
- Ahn?
- Quero ir junto!
- Sinto muito, não posso leva-la. É arriscado.
- Arriscado? Arriscado é eu ficar sozinha aqui. Se você me achou, essa outra fonte pode me achar também.
O Dr. Oculto pensa por alguns instantes e por fim concorda.
- Está bem. Se você se sentiu inclinada a ficar aqui hoje, deve ter sido por algum motivo.
- Coincidência, talvez?
- Não existem coincidências para quem anda no caminho da arte. É uma das primeiras lições que aprendi.
Zatanna apanha uma mala e corre para o banheiro. Em minutos, ela volta vestida com sua melhor roupa de show: meias arrastão, uma mini-saia esvoaçante, uma blusa azul, um casaquinho de mangas longas e uma cartola típica dos mágicos.
- Não é uma roupa muito discreta – critica o Dr. Oculto.
- Não sou discreta. Sou uma artista! – replica a mágica.
- Hm, certo...
Oculto retira de seu bolso o seu amuleto mágico e abre um novo portal no ar. Ambos penetram na fenda, desaparecendo completamente. O ponto luminoso produzido por Zatanna desaparece no mesmo instante.
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Na periferia de King’s Cross, a Sra. Higgins termina o seu bordado. Ela se levanta e, com orgulho, abre a peça. Por alguns instantes ela permanece muda e sorridente, admirando sua obra. De repente, um barulho estrondoso vindo da rua chama sua atenção. Ela caminha apressadamente e olha através do vidro da janela fechada.
Criaturas sibilantes e asquerosas arrastam-se pela rua anteriormente vazia. Algumas possuem forma humanóide, outras sequer lembram qualquer animal terrestre. Algumas possuem olhos vermelhos e incendiários, outras emitem uma pálida luz mortiça através da pele alva. São dezenas, avançando em direção ao centro da cidade. Os gritos desesperados dos moradores de King’s Cross começam a preencher a escuridão noturna.
Será uma longa madrugada.
Continua...
No próximo número: King’s Cross é a mais nova representante do inferno na terra. E cabe ao Dr. Oculto e Zatanna derrotarem um mal secular, para que este não se alastre pelo mundo. Demônios! Caos! E a participação especial de um campeão da Ordem! É a nova era da magia que se inicia! Só aqui, no ULTIMATE UNF! Não perca!
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